O paraibano Elivelton Santos é o retrato do surfe amador brasileiro: sem verbas, mas talentoso. Morador de uma aldeia indígena na Paraíba, o atual vice-campeão mundial sub-18 não tem patrocinadores ou familiares surfistas, viaja de ônibus – ou carona – para os campeonatos dentro do País e ainda sonha em conseguir apoio para se arriscar na elite profissional e mostrar seus aéreos ao astro Kelly Slater.
Enquanto o Brasil ainda vive momentos de euforia com a vitória de Filipe Toledo na etapa do Rio de Janeiro do Circuito Mundial (WCT), a Gazeta Esportiva publica a reportagem Tempestade no Deserto, retratando o amadorismo da gestão do surfe nacional e a dificuldade na revelação de novos talentos. Este é o sétimo e último capítulo da série.
Elivelton começou a surfar com sete anos de idade, aproveitando a prancha quebrada de um primo. Mesmo sem ser treinado por parentes ligados ao esporte, como Filipe Toledo, Miguel Pupo e Gabriel Medina, que tiveram os pais como mentores, ficou com o vice-campeonato da categoria sub-18 do Mundial, disputado no Equador em 2014. Na bateria final, foi superado apenas pelo compatriota Luan Wood. Agora luta para não ser vítima da falta de estrutura do esporte no País.
Como a Confederação Brasileira de Surfe (CBS), sem recursos financeiros, não custeia a viagem dos atletas às competições internacionais, o morador da Aldeia Forte, em Baía da Traição, investiu aproximadamente R$ 4 mil para viajar a Salinas em busca de um resultado que chamasse a atenção de possíveis patrocinadores.
“O que me ajudou é que no ano passado ganhei duas motos de premiação em campeonatos aqui no Brasil”, afirmou Elivelton, da tribo potiguara. “De vez em quando recebo uns trocadinhos, familiares e conhecidos me ajudam para eu poder viajar e está indo tudo bem, graças a Deus”, completou.
Apesar do otimismo do surfista paraibano, a falta de dinheiro e estrutura já atrapalha o desenvolvimento da carreira. Em abril, ele perdeu as etapas de Mar del Plata do circuito Pro Junior, vencida pelo catarinense Luan Wood, e do WQS, que teve o compatriota Robson Santos como campeão.
Quando viaja dentro do Brasil para competir, geralmente usa ônibus ou busca caronas para diminuir os custos. Em abril, já tinha passagem comprada para Belém, e inscrição paga para a segunda etapa do Circuito Brasileiro, em Salinópolis, mas desistiu do evento por causa de uma virose.
“Ainda falta um patrocínio para me levar para os campeonatos importantes que estou perdendo, pagar inscrição, ter uma alimentação certa e treinamento físico”, explicou. Enquanto não consegue um apoiador, utiliza equipamentos de ginástica da namorada para tentar compensar a defasagem na preparação atlética.
Mesmo assim, Elivelton mantém o sonho de alcançar a elite do surfe mundial, apostando nos aéreos que impressionaram os juízes no Campeonato Mundial da Associação Internacional de Surfe (ISA). No evento do Equador, se encantou com a estrutura das equipes rivais, nem tanto com o desempenho.
Por isso, acredita que possa chegar às competições da Liga Mundial de Surfe (WSL) e finalmente conhecer o norte-americano Kelly Slater, 11 vezes campeão do mundo. O veterano, derrotado por Gabriel Medina na briga pelo título da temporada passada do WCT, pode se aposentar ao fim do ano.
“O surfe brasileiro está demais. Lá fora eles têm muito patrocínio, o que é bom, mas fazem um surfe de linha. A gente aqui tem nossa arma secreta, o aéreo”, gabou-se. Ainda longe da elite do circuito, acompanha as competições pela televisão, vendo os replays das manobras utilizadas por Filipe Toledo e Gabriel Medina para tentar melhorar sua técnica.
O caminho à elite passa pelas competições do WQS, divisão de acesso, em que só os valores das inscrições das etapas, entre US$ 200 e US$ 325 de acordo com a pontuação no ranking– fora os até US$ 250 de anuidade -, já são demais para o atleta paraibano. O evento de Saquarema, no início de maio, valia 10.000 pontos ao campeão, o máximo do circuito, e por isso tinha uma das taxas mais caras da temporada.
O problema de Elivelton Santos pode começar a ser solucionado em breve. O surfista se inscreveu no programa Bolsa Atleta do governo paraibano, que pelo primeiro ano passará a beneficiar modalidades não olímpicas. A lista de contemplados ainda não tem data para ser divulgada.
“Nunca vou desistir. Esse é meu objetivo e sonho. Quero estar lá e conhecer o Kelly Slater. Como todo o mundo fala que ele vai sair daqui a pouco, preciso conseguir logo”, sentenciou.
O programa governamental seria um paliativo dentro de uma estrutura falha da modalidade no Brasil. Para que Elivelton não fique pelo caminho, o País precisa investir em seus atletas de base em vez de esperar surfistas prosperarem por esforços individuais. Só assim, o impacto da Brazilian Storm irá além de uma chuva de verão, deixando menos árido o terreno das próximas gerações.
Índios Potiguara da Paraíba em foco
Com Gazeta Esportiva
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